sexta-feira, 27 de abril de 2018

Escolhas contábeis: uma síntese


Morpheus (Matrix)

No texto de hoje tratarei um tema precedente ao famigerado gerenciamento de resultados (earnings management): escolhas contábeis (accounting choices). Para tanto, antes de abordar algumas definições, pretendo apresentar alguns conceitos gerais (porém essenciais) da Teoria Contratual da Firma e da Teoria da Agência, bem como o papel das demonstrações financeiras e da informação contábil financeira útil. 
Antes de tudo, pergunto: “O que é uma organização econômica”. Na visão neoclássica, enxergamos as organizações econômicas como atores sociais movidos por anseios (ora, uma organização visa lucro), “personificadas”, em sua essência. Antagonicamente, surge uma outra visão, fornecida pela Teoria Contratual da Firma, afirmando que uma organização econômica é, sob sua perspectiva, um conjunto de contratos (entendimentos mútuos) entre agentes (indivíduos). Ou seja, organizações surgem em decorrência de compromissos (contratos) entre os mais diversos indivíduos, dentro de um contexto denominado “firma” (daí Teoria Contratual da Firma). Shyam Sunder apresenta isto em seu livro “Teoria da Contabilidade e Controle” (ótimo livro, recomendo!). A firma, então, seria algo nessa perspectiva: 



Conseguinte, precisamos entender a Teoria da Agência (melhor explicada aqui). Bastante abordada entre os acadêmicos da contabilidade, economia e administração, esta teoria preconiza que uma relação de agência surge a medida que um indivíduo (o principal) delega a outro (o agente) a função de realizar alguma atividade (Jensen & Meckling, 1976). Simplificando: se contrato alguém para desempenhar uma função, espero que este alguém faça o máximo possível para atender o que foi acordado (aqui, surge a figura da maximização da utilidade), correto? Bem, eis que surge um problema... pois estas relações são construídas sob um cenário de assimetria informacional (via seleção adversa, ex ante, via risco moral, ex post), logo o agente tem acesso a informações que o principal não tem e vice-versa. Ok, mas como a Teoria Contratual da Firma e a Teoria da Agência se relacionam?
Macho-Stadler e Pérez-Castrillo (2001) afirmam que esta relação de agência (mencionada no parágrafo anterior) pode ser caracterizada como uma relação contratual bilateral (a relação surgiria por meio de um contrato, formal ou informal). Logo, toda relação de agência é contratual, mas nem toda relação contratual é, necessariamente, uma relação de agência (podem existir relações onde o agente não tem margens para tomar decisões que afetem o principal). Devido a assimetria informacional, um contrato é inevitavelmente incompleto (Milgrom & Roberts, 1992). E aqui surge uma das ideias que mais gostei no livro do Sunder: como a contabilidade pode ajudar a mitigar os problemas gerados pela incompletude de informações, reduzindo o conflito de agência e melhorando os contratos?

A contabilidade ajuda a implementar e a fazer cumprir os contratos que constituem a firma” (Sunder, 2014).

Traduzindo: A (principal) delega a B (agente) uma determinada função. Esta delegação é dada via contrato. B, então, passa a desempenhar a função que lhe foi delegada. Como A pode verificar o desempenho de B? Aqui, surgiria a contabilidade, como uma “lupa” que permite verificar o andamento destes contratos – seja com os acionistas, seja com os funcionários, fornecedores, etc.



Cadê as escolhas contábeis? Que enrolação. Pensemos. Os números contábeis são tidos como base para diversos contratos (Silva, 2008), ou seja, apelamos aos números para verificar se o desempenho (por desempenho não entendam, necessariamente, resultado!) está de acordo com o que se espera (ex.: acionista ao verificar o desempenho dos gestores, pelos resultados; credores ao verificar a liquidez, etc). O gestor, por sua vez, detém o poder discricionário sobre estes números contábeis (Macho-Stadler & Pérez-Castrillo, 2001). Lhes pergunto: surge, aqui, um problema? Será que quem produz a informação não estará tentado a mostrar, por meio da contabilidade, o que a outra parte deseja ver? Neste momento, surge a importância de entendermos as escolhas contábeis. 

Teoria da Agência


A teoria da agência é mostrada em 1976 por Jensen e Meckling como sendo um resultado da teoria da firma.  Jensen e Meckling citam que o desenvolvimento da teoria do direito e propriedade, teoria da agência e teoria das finanças traz o surgimento da teoria de propriedade da firma. A análise feita pelos autores faz um relacionamento entre os elementos dessas três teorias, para que depois os autores lancem uma serie de novas questões sobre qual é a definição de firma, a separação entre posse e controle, responsabilidade social do negócio, função objetiva da cooperativa, identificação de uma estrutura capital ótima, entre outros.

Autores argumentam que a firma é uma “caixa preta”, e essa caixa preta pode ser manipulada de forma a atender às condições marginais relevantes no que diz respeito a inputs e outputs, maximizando, os lucros.
Os autores definem a relação de agência como um contrato sob o qual uma ou mais pessoas emprega uma outra pessoa (agente) para executar em seu nome um serviço que implique a delegação de algum poder de decisão ao agente. Para os autores se os dois agentes dessa relação se maximizarem existe uma boa chance que o agente nem sempre agirá de acordo com os interesses do principal. Os autores complementam que em geral impossível para o principal ou o agente manter a relação de agência a um custo zero para assegurar que o agente tomará decisões de nível ótimo do ponto de vista do principal.
Além disso, os autores definem custo de agência como a soma das despesas de monitoramento por parte do principal, das despesas com a concessão de garantias contratuais por parte do agente e do custo residual. Os autores complementam que os custos de agência surgem em qualquer situação que envolva esforço cooperativo por parte de duas ou mais pessoas, mesmo se não houver uma relação principal agente claramente definida.
Complementando, os autores citam que as relações contratuais compõem a essência da firma, não somente com os empregados, mas também com fornecedores, clientes, credores etc. Os autores complementam que a firma não é um indivíduo. A firma é uma ficção legal que serve como um foco para um processo complexo no qual os objetivos conflitantes de indivíduos atingem um equilíbrio no contexto de relações contratuais.
Quando uma firma é de propriedade integral é administrada pelo proprietário, ele tomara decisões que maximizarão a utilidade para ele mesmo.  Porém quando o proprietário-administrador vende direitos sobre seu capital próprio (50% da empresa), os custos de agência serão gerados pela divergência entre o seu interesse e o interesse dos acionistas externos, já que ele, neste caso, arcará apenas com uma parcela dos custos de quaisquer benefícios não pecuniários que utilizará para maximizar a sua própria utilidade.
Assim, quanto maior for a parcela de acionistas externos com parcela do capital do proprietário, maiores serão os custos gastem mais recursos para monitorar o comportamento do administrador e no caso do administrador quanto menor for sua parcela na empresa maior será a apropriação de recursos corporativos na forma de vantagens ou mordomias. Para Jensen e Meckling (1976) essa não é a única forma nem a principal fonte de conflito que pode existir dentro de uma firma.
Diante disso os autores afirmam que a magnitude dos custos de agência discutidos vai variar de uma firma a outra. Os custos de agência vão depender das preferências dos administradores, da facilidade na qual eles conseguem exercitar suas próprias preferências em oposição à maximização de valor na tomada de decisões e dos custos das atividades de monitoramento e de concessão de garantias contratuais. Além disso, os custos de agência também dependerão do custo de mensurar e avaliar o desempenho do administrador (agente), o custo de elaborar e implementar um índice para definir a remuneração do administrador que se correlacione com o bem-estar do proprietário (principal).
Assim, o artigo de Jensen e Meckling (1976) tratam sobre as divergências entre a propriedade e o controle de uma firma. Focando na discussão sobre os custos de agência e as relações entre os proprietários e os acionistas. Também vale-se ressaltar que apesar de todos os custos e problemas existentes em um ambiente corporativas, as empresas em sua maioria ainda deixam o controle do seu patrimônio na mão dos gestores.


sexta-feira, 20 de abril de 2018

Contabilidade Divertida



Olá, caros leitores do Olhar Contábil! O final de semana está chegando e é tempo de aproveitar.. Lendo muitos artigos e mais uma postagem aqui no blog. Isso mesmo. Dessa vez, traremos algo diferente do que normalmente é escrito aqui.
Desde já, gostaríamos de frisar que essa postagem tem caráter meramente cômico, claro tendo como base um pouco do arcabouço teórico da contabilidade.
Então, sem mais delongas, vamos lá!
A concretização do namoro do contador(a)
O namoro do contador ou contadora é assim bem parecido com um ativo e acontece da seguinte maneira: primeiro há a fase do reconhecimento na qual o contador identifica o bem e já pensa na geração de benefício econômico futuro.
A segunda fase é a mensuração na qual será calculada tudo que será gasto para conquistar o amado ou a amada. Idas ao cinema, restaurantes, parques... Tudo será devidamente contabilizado e serão atribuídos os devidos valores monetários.
Por fim, a terceira fase que é a evidenciação e aí o(a) contador(a) já consegue conquistar a pessoa desejada e começa a namorar, então, há a evidenciação/divulgação, ou seja, mostra-se isso no facebook, instagram e demais redes sociais para todo o mundo ver, afinal segundo Aristóteles o homem é por natureza um animal social.

Espero que vocês tenham gostado e se houver um feedback positivo vamos falar sobre a segunda parte desse post... Pois com o tempo o ativo vai se depreciando e assim são os relacionamentos, mas nem tudo é desgastado totalmente, visto que em boa parte das vezes tem-se valor residual! 

quinta-feira, 12 de abril de 2018

Gerenciamento de Resultados?


Trataremos nesta semana sobre a temática de Gerenciamento de Resultados, assunto recorrente que vem sendo abordado pelos periódicos. Falaremos sobre o artigo The real effects os Mandatory Quarterly Reporting (Os efeitos reais do relatório trimestral obrigatório) publicado no The Accounting Review em Setembro de 2017.
Antes de comentar sobre o artigo, gostaríamos de elencar alguns conceitos importantes para aqueles que estão conhecendo agora essa temática. A primeira pergunta é: O que é gerenciamento de resultados?
Segundo Cupertino et al (2016, p. 233) o gerenciamento de resultados corresponde “a decisão tomada por alguns gestores ao empregar métodos contábeis ou atividades operacionais diretas para atingir metas específicas relativas aos resultados apresentados nas demonstrações financeiras”.
A literatura costuma dividir as formas de gerenciamento de resultados em duas principais: baseada em Accruals (ABM) relacionada as escolhas contábeis dentro das normas contábeis e em Atividades Operacionais/Reais (RAM) que consiste no afastamento das operações normais da empresa em detrimento do resultado.
O artigo escolhido para este post foca especificamente no gerenciamento baseado nas atividades reais que tem por objetivo principal verificar como um Relatório Trimestral Obrigatório denominado Interim Management Statements (IMS) introduzido na União Europeia afeta as decisões das empresas em relação ao Gerenciamento de Resultados das Atividades Reais.
 A problematização do trabalho é de que a divulgação de relatórios com maior frequência potencializa gerenciamento de resultados das atividades reais direcionados à metas de ganhos intermediários sugerindo uma visão de curto prazo impulsionada pelo requisito de divulgação mais frequente.
Sustentam a hipótese de que os gerentes que são obrigados a divulgar trimestralmente tomam decisões de negócios de curto prazo, com fins de cumprimento de metas trimestrais de lucro podendo afetar, inclusive, um melhor desempenho a longo prazo
Para comparar o Gerenciamento das atividades reais (RAM) após as mudanças foram coletados, no período de 2005 a 2013, dados das empresas da União Europeia que foram recentemente obrigadas a emitir os IMSs (grupo de tratamento) em comparação com as empresas que anteriormente já emitiam trimestralmente (grupo de controle) e para medir o RAM utilizou-se o modelo de Zang (2012).
Os autores confirmaram a hipótese de que o Gerenciamento das Atividades Reais (RAM) aumentou para aquelas empresas que não apresentavam IMS´s e passaram a ter essa obrigação, em comparação com aquelas que já emitiam relatórios trimestrais.
Os fatores incentivadores é o fato de as empresas procurarem um maior direcionamento para metas de lucros trimestrais, como consequência da maior pressão exercida pelo mercado de capitais e uma maior impaciência do investidor, o que explica um maior influência no Gerenciamento de Resultados.
            Existem diversos estudos no Brasil sobre essa temática, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte o Professor Rodolfo (UFRN) publicou recentemente um artigo com temática semelhante utilizando o modelo do Prof. Edilson Paulo (UFPB). Vale à pena a leitura desses trabalhos.



Link dos artigos:


http://revistas.face.ufmg.br/index.php/contabilidadevistaerevista/article/view/3729/pdf